A canção dos pássaros
Por Dom Pedro José Conti - Bispo
de Macapá
Um dia uma criança perguntou a seu pai:
- Por que os
pássaros cantam? Será que é porque estão alegres? Ou por que curtem a liberdade
de voar? Será que é porque precisam se comunicar? Ou é uma maneira para
agradecer pelo dom da vida? E os pássaros que estão presos, por que cantam? Por
medo ou é um grito de desespero? O que os pássaros dizem com o seu cantar?
O pai, sabiamente,
respondeu:
- Minha filha os pássaros cantam não é porque estão
alegres ou tristes, não é porque querem conversar ou desabafar, eles cantam
porque têm uma canção dentro de si.
No dia dos pais, uma pequena história de pai e filha.
Ambos escutando o canto dos pássaros. Às perguntas curiosas da criança, o pai
sugere buscar a resposta dentro de si: afinal toda criatura participa da grande
sinfonia da vida, dom de Deus para todos.
Também Jesus, ainda no capítulo seis do evangelho de
João, responde às murmurações dos seus interlocutores chamando em causa o Pai
que deve ser escutado. Quem se deixa “instruir” pelo Pai reconhece o Filho que
ele enviou, o acolhe, crê nele e possui a vida eterna. Dessa maneira, o
evangelista João nos coloca na frente de uma opção. Quem se alimenta com o Pão
da Vida, Jesus, pessoa, mensagem e mistério de amor, participará da
ressurreição; o maná saciou o povo no deserto, mas não foi garantia de vida.
Somente Jesus é o Pão vivo descido do céu, penhor de vida eterna. Nada de
mágico ou fabuloso como o “elixir de longa vida” das lendas medievais. Ao contrário, algo de muito concreto que,
porém, somente se pode entender à luz da vida doada de Jesus. “Carne e sangue”
são a sua própria vida oferecida até o sacrifício da cruz.
O Deus dos cristãos é um Deus comprometido com a história
da humanidade, capaz de se comunicar, “instruir”, apontar e abrir caminhos
novos. Fez isso no passado, não faltaram sinais, mas o povo nunca se deixou
libertar da tentação de dominar, de ser superior aos outros, de usar a força no
lugar da misericórdia. Também nós, se não mudarmos a nossa maneira de pensar e
de olhar a vida de Jesus, ele sempre poderá nos parecer como o mais fracassado
de todos: um condenado à morte de cruz, na maior vergonha e decepção. Ou aquele
foi um ato supremo de amor-doção? Quem nos ensina a resposta certa? O
“discípulo” que se deixa “instruir” por Deus-Pai, que “escuta” o Filho que ele
enviou, que se “alimenta” com o sinal do amor – a Eucaristia - consegue
entender a grandeza do mistério do amor de Deus e, assim, participa da vida
divina.
Tudo isso parece tão difícil, tão longe do nosso dia a
dia. No entanto, ao nos chamar à vida, o Pai, bondoso e misericordioso, coloca
no coração de cada um uma canção de bondade e de gratidão pela vida, pela
natureza, pela fraternidade humana. O ser humano não está irremediavelmente
perdido. Não estamos cambaleando num deserto sem fontes, sem alimentos, sem
rumo. Basta deixar brotar o canto de amor que está dentro de nós, escutá-lo
bem, para aprendê-lo e cantá-lo todas as vezes que pudermos, nos momentos de
alegria e nos momentos de provação, sem desistir. Essa canção vem junta com o
dom da vida, da família que nos gerou e nos acolheu, vem junta com a capacidade
de nos maravilhar pelas coisas bonitas que existem e que também recebemos em
uso. Se quisermos, podemos fazer da nossa vida um canto de esperança e não um
lamento sem fim ou um grito que amedronta. Este é o primeiro passo para
aprender a “escutar” o que o Pai nos diz, para “entender” o que o Filho fez,
para deixar que o Espírito Santo de Amor “dirija” o coral da história.
Feliz aquele pai que ensina aos seus filhos a escutar a
canção de amor que têm em seu coração. Desde criança, para quando crescerem
saber cantar junto com tantos irmãos e irmãs de boa vontade. Cantar com voz
forte e corajosa, sempre, para, um dia, toda a humanidade louvar pela vida, dom
de Deus, sem ódio e sem lágrimas, em paz, penhor de Vida Eterna. Como a
Eucaristia.
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